Entrevista com Antonio Negri
No dia 1º de agosto, Antonio Negri (Pádua, 1933) completou 90 anos. Nesta entrevista ao Il Manifesto, o filósofo comunista italiano reflete sobre a dificuldade de viver com lucidez a doença e a velhice, a experiência da criminalização midiática e política, a prisão e o exílio. Além disso, analisa a crise da esquerda e a derrocada do PCI na Itália. Negri publicou uma autobiografia em três volumes, Historia de un comunista, cujos dois primeiros livros foram publicados na Espanha pela Traficantes de Sueños.
Pensamento e Reflexão
“Para mim, a referência a Francisco é amor versus propriedade: exatamente o que poderíamos ter feito nos anos 1970, virando esse desenvolvimento e criando uma nova forma de produzir. Francisco nunca foi suficientemente retomado, nem a importância que o franciscanismo teve na história da Itália foi devidamente considerada. Cito porque quero que palavras como amor e alegria entrem na linguagem política”, afirma Antonio Negri.
“Noventa anos é um século curto. Pode haver vários séculos curtos. Há o período clássico definido por Hobsbawm, de 1917 a 1989. Houve o século americano, que foi bem mais curto. Durou desde os acordos monetários e de governança global em Bretton Woods até os ataques às Torres Gêmeas em setembro de 2001. Quanto a mim, meu longo século começou com a vitória bolchevique, pouco antes de eu nascer, e continuou com as lutas dos trabalhadores e todos os conflitos políticos e sociais dos quais participei”, comenta Negri.
“Estamos em um momento de transição, mas na realidade sempre estivemos. Embora possa passar despercebido, encontramo-nos numa nova era marcada por um ressurgimento mundial de lutas, contra as quais existe uma dura resposta. As lutas dos trabalhadores começaram a se cruzar cada vez mais com lutas feministas, antirracistas, em defesa dos imigrantes e pela liberdade de movimento, ou com lutas ambientais”, destaca o filósofo.
Lutas Políticas e Experiências Pessoais
Antonio Negri, conhecido por contribuir para a revista italiana de operaismo, como pesquisador e militante, lembra de suas experiências no campo político. “A década de 1970, quando o capitalismo antecipou fortemente uma estratégia para o seu futuro. Com a globalização, precarizou-se o trabalho industrial e todo o processo de acumulação de valor. Nessa transição, foram lançados novos polos produtivos: trabalho intelectual, trabalho afetivo, trabalho social que constrói a cooperação.”
“Porque faltou uma resposta da esquerda. De fato, por muito tempo houve um total desconhecimento desses processos. Desde o final da década de 1970, foi eliminada qualquer força intelectual ou política, pontual ou de movimento, que tentasse mostrar a importância dessa transformação e que visasse a reorganização do movimento operário em torno de novas formas de socialização e organização política e cultural”, constata Negri.
Presença Marcante e Perseguições
“As prisões de 7 de abril de 1979, primeiro momento da repressão ao movimento de autonomia operária, marcaram um antes e um depois. Por diversos motivos, a meu ver, ficou também para a história do manifesto, graças a uma vibrante campanha de garantia que durou anos, um case jornalístico inédito realizado com militantes do movimento, um grupo de bravos intelectuais e o Partido Radical”, lembra Negri.
O filósofo ainda acrescenta que “o PCI massacrou aqueles que denunciaram a situação em que ele se meteu. Muitos de nós contamos a ele naqueles anos. Havia outro caminho, que consistia em ouvir a classe trabalhadora, o movimento estudantil, as mulheres e todas as novas formas de organização das paixões sociais, políticas e democráticas. Propusemos uma alternativa de forma honesta, limpa e massiva.”