Restrições na entrada de Jerusalém e violação da liberdade religiosa: A difícil rotina dos palestinos nos postos de controle

Outra tarefa que tínhamos era a verificação dos postos de controle para a entrada na cidade de Jerusalém. Os principais são dois, no norte, o posto de Qalandia, e no sul, o de Belém. Nesses postos, é onde ocorre a passagem de pessoas da Cisjordânia para Jerusalém, para trabalhar principalmente na mão de obra que é utilizada pelos israelenses.

Esses postos de controle possuem um papel importante, pois a cidade de Jerusalém está isolada por um muro que separa a cidade da Cisjordânia. Logo, não é possível atravessar para Jerusalém sem passar por esses postos de controle militares. Fazíamos o monitoramento desses locais algumas vezes por semana, pois queríamos tanto pegar o acesso ao trabalho quanto o acesso à vida comum, e principalmente, o acesso à liberdade de culto.

Dentro de Jerusalém, encontra-se a Mesquita de Al-Aqsa, que é o terceiro espaço local mais sagrado para os muçulmanos. Toda sexta-feira, que é um dia sagrado para os muçulmanos, milhares de pessoas vão até Al-Aqsa para rezar. É um dia de feriado, um dia de folga, então muitas pessoas da Cisjordânia atravessam os postos de controle para acessar esse momento religioso.

Nesses postos de controle, é realizado um processo de revista das malas em uma esteira, parecido com o de aeroporto. Após a revista, passa-se por cancelas de metal onde é apresentado um cartão magnético ou a identidade para o soldado responsável pela liberação. Essa rotina é enfrentada pelos palestinos todos os dias, porém, percebíamos que nos dias de trabalho a rejeição era muito pequena, mas aos sextas-feiras, que era o dia de oração mais sagrado, a rejeição era imensa, negando o acesso à liberdade de culto de forma arbitrária.

Quanto aos dias anteriores ao início do confronto, não tínhamos ideia de que algo assim ocorreria, pois pegou todos de surpresa. No entanto, é importante ressaltar que o dia a dia dessas comunidades é extremamente tenso. Na Palestina, não se pode fazer planos, pois não se sabe se no dia seguinte os postos de checagem estarão abertos ou se é possível entrar em Jerusalém. Existe sempre o receio de incursões militares que impossibilitem sair de casa. Essa incerteza é decorrente do ambiente constantemente opressivo em que vivem, colocando as populações em situações de humilhação.

Há uma construção sólida da identidade nacional palestina, uma consciência muito presente nas crianças, nos adolescentes e nos mais velhos. Os palestinos não normalizam a violência, pois sabem exatamente o que passam. Durante minhas conversas com eles, muitas vezes percebia que queriam falar sobre suas vidas, compartilhar suas histórias. Eles não normalizam, estão cientes da opressão que vivem.

Um episódio particularmente chocante para mim ocorreu quando estava voltando de Ramallah. Sentado ao lado de dois meninos palestinos, conversamos sobre a vida e um deles me contou sobre a morte de seu irmão. O irmão tinha ido a Al-Aqsa e, em algum momento, foi morto pelos soldados com um tiro de fuzil. Ele me mostrou uma foto do irmão morto, deitado no chão, completamente ensanguentado. A chocante realidade da morte do irmão, um jovem estudante de engenharia, foi um retrato do sofrimento e da perda experimentados pelas famílias palestinas.

A sociedade palestina lida diariamente com restrições, interrogatórios e a possibilidade de punição coletiva. Dentro das comunidades palestinas, existe um temor em conviver com as famílias que são alvos desse tipo de violência. Porém, a sociedade é resiliente e não normaliza essa situação, graças à sua forte base familiar e à passagem das histórias de geração em geração.

No que diz respeito à receptividade como brasileiro, posso dizer que fui muito bem recebido pelos palestinos. O governo brasileiro foi o único a enviar um avião das Forças Aéreas para resgatar as pessoas e meus colegas. Os palestinos demonstraram interesse quando eu mencionei ser do Brasil, alguns até arriscaram falar português por terem família no país. Fui acolhido pela família que me recebeu, a qual frequentava uma igreja cujo padre era brasileiro, e todos o amavam. Os palestinos gostam dos brasileiros e veem o Brasil como uma potência no futebol.

Acredito que o Brasil deve assumir um protagonismo nessa questão, sendo uma voz moderadora. Os palestinos respeitam o Brasil e o governo brasileiro. Somos vistos como um povo guerreiro e querido pelos palestinos.

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