Eleições presidenciais na Argentina destacam posicionamentos em relação ao Brasil e a questões regionais

Neste domingo (22/10), a Argentina irá às urnas para a eleição presidencial. Em uma intensa campanha eleitoral, surpreendentemente atravessada por debates sobre direitos humanos e a possível dolarização do país, emergiram posicionamentos em relação à questões regionais e sobre um importante parceiro comercial: o Brasil.

Na eleição primária, que ocorreu em 13 de agosto, os três candidatos mais votados foram Javier Milei, do partido de extrema direita A Liberdade Avança (29,8%); Patricia Bullrich, da ala mais radical do partido de direita Juntos pela Mudança (28%); e Sergio Massa, da coalizão peronista União pela Pátria (27,2%).

Nos dois debates presidenciais televisionados, não houve preponderância de temas internacionais, como afirma José Octavio Bordón, presidente do Conselho Argentino para as Relações Internacionais (Cari) a Opera Mundi. “Esta campanha foi concentrada sobre a macroeconomia argentina, expressado pela preocupação da população com a inflação, o custo de medicamentos e a crise que vivem os produtores”, pontuou.

No entanto, os temas regionais estiveram presentes em alguma medida e ainda são aspectos importantes para entender a colocação da Argentina na América Latina. Elencamos alguns tópicos importantes para entender quem são os presidenciáveis que disputam o próximo governo da Argentina, e que podem concorrer em um eventual segundo turno no dia 19 de novembro.

Relações e opiniões dos candidatos sobre Lula e Bolsonaro

A breve convergência entre o governo de Alberto Fernández e Lula da Silva representa uma afinidade política progressista entre os países vizinhos. O suporte mútuo também se reflete nas campanhas: o peronismo deu suporte à candidatura de Lula, assim como o atual presidente brasileiro expressa seu apoio ao candidato peronista, Sergio Massa. Além disso, a campanha de Massa conta com parte da equipe da última campanha de Lula.

Diplomático, Massa não costuma dirigir elogios ou críticas aos mandatários brasileiros. Como ministro da Economia, reuniu-se com Jair Bolsonaro em prol das articulações no Mercosul e da relação entre ambos os países.

Por outro lado, Patricia Bullrich e Javier Milei expressaram em diversas oportunidades suas afinidades com o ex-presidente brasileiro.

Bullrich é candidata pela coalizão que também coincidiu em mandato com o ex-mandatário Bolsonaro, com a diferença de encontrar afinidades políticas e discursivas. Em 2019, ela chegou a retrucar a ideia de que seu partido era “aluno de Bolsonaro” em uma entrevista televisiva: “nós é quem somos o guia das coisas que [Sergio] Moro e Bolsonaro estão fazendo no Brasil”, disse.

Após a vitória de Lula em 2022, Bullrich não felicitou o presidente eleito no Brasil. Quando questionada por que, disse: “ele põe um boné CFK [Cristina Fernández de Kirchner] 2023 segundos depois de ter ganhado”, disse, o que considerou uma “ingerência na política interna”.

No caso de Milei, as afinidades são mais agudas, uma vez que ocupa o mesmo espectro político de Bolsonaro: a extrema direita. Pode ser identificado em algumas menções como “o Bolsonaro argentino” e, apesar das diferenças, se conectam em valores como a antipolítica, severidade das forças de seguranças e militarismo, liberalismo econômico e o conservadorismo nos costumes (apesar de que Milei integra o movimento “libertário”; em seu sentido clássico, favorável à “liberdade individual”). E, em geral, se assemelha à figura “disruptiva” e “algo novo” que atrai eleitores impactados com a crise econômica.

A amizade entre Milei e a família Bolsonaro é transmitida em fotos de encontros recentes com um dos filhos do ex-presidente Eduardo Bolsonaro. Antes da eleição primária, Milei respondeu a um post de apoio por parte de Eduardo no ex-Twitter, atual X.

Economia e relações com o Brasil

Os três candidatos preferidos representaram durante a campanha o posicionamento de seus espaços políticos com relação ao Brasil. Como países vizinhos e mutuamente entre os principais parceiros comerciais, o vínculo do novo governo argentino com o Brasil é um ponto chave.

Ainda que de uma ala mais extremista dentro de seu partido, Bullrich preza pelas relações comerciais com os principais parceiros da Argentina. Em uma entrevista em que expressou contrariedade com o Brics, alegou: “se cortamos relações com o Brasil, destruímos nossa indústria; se cortamos relações com a China, destruímos nosso campo. Isso não tem nada a ver com o Brics”, concluiu.

A convergência do terceiro governo Lula com o mandato de Fernández, ainda que em sua reta final, foi aproveitado política e estrategicamente pelo governo argentino. Como ministro, Massa foi um ator chave na articulação com o Brasil para fortalecer os vínculos comerciais como países vizinhos – algo que, enfatizou, foi rompido durante a gestão do ex-presidente Bolsonaro.

Já em período de campanha eleitoral, viajou ao Brasil em agosto e avançou em acordos, como a retomada da integração fluvial da rota marítima com a Argentina e o financiamento do Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF) para as exportações do Brasil à Argentina.

O candidato mais votado na eleição primária, Milei afirmou em diversas ocasiões que um eventual mandato seu não faria “negócios com comunistas”. Segundo o presidenciável, a classificação refere-se a países como Rússia, China e Brasil, com quem promete romper relações comerciais.

“Não só não vou fazer negócios com a China, não vou fazer negócios com nenhum comunista”, afirmou Milei, em entrevista ao apresentador norte-americano Tucker Carlson, em visita à Argentina em setembro especialmente para entrevistar o extremista argentino. “Sou um defensor da liberdade, paz e da democracia. Os comunistas não entram aí. Os chineses não entram aí. [Vladimir] Putin não entra aí. Lula não entra aí”, enfatizou. “Queremos ser o farol moral do continente.”

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