Andrea Beltrão estreia peça “Lady Tempestade” no Teatro Poeira, em Botafogo, com direção de Yara de Novaes e texto de Silvia Gomez.






Entrevista com Andrea Beltrão

Entrevista com Andrea Beltrão

Com Andrea Beltrão, o espetáculo é sempre agora. Terminado um ensaio da peça “Lady Tempestade”, que estreia nesta quinta-feira, no Teatro Poeira, em Botafogo, na zona sul do Rio de Janeiro, ela é rodeada por dezenas de jovens. Eles nem precisavam dizer que estudavam artes cênicas. Essa é uma gente que se identifica de longe. Desse pessoal descolado, emanava um certo deslumbramento. Afinal de contas, naquela noite, todos aprenderam que a exuberância de uma atriz não se encerra em cena.

Andrea tem 60 anos de praia e quatro décadas de tablado. Ela é sincerona e não para quieta. Tem a pele dourada, a forma esguia e as pontas espevitadas de seus cabelos são próprias de quem lê três jornais todos os dias. Sua rotina se divide entre o cinema, a próxima novela das seis —a última trabalhando como funcionária da TV Globo, ela diz à Folha— e o teatro político. Andrea é um mulherão.

“Eu amo o Brasil. Não tenho nenhuma vontade de sair daqui. Detesto o raciocínio ‘ai, aqui é uma derrota, ai, eu vou para a Europa porque a educação daqui é ruim’. Tenho orgulho de morar aqui. Gosto dessa gente misturada, desse caos e dessa zona”, diz ela.

Em sua trajetória, ter fundado o Poeira, em 2005, com recursos seus e de sua amiga, a atriz Marieta Severo, talvez tenha sido a maior aposta no teatro e no Brasil. Mas nunca foi tão difícil manter o espaço. Em agosto, o diretor Aderbal Freire-Filho, marido de Marieta, que ali encenou, nos anos 2000, “Moby Dick” e “O Púcaro Búlgaro”, morreu, vítima de um acidente vascular cerebral. “Não sei te explicar o tamanho do buraco que fica sem ele. Muitas vezes eu penso ‘ah, se o Aderbal estivesse aqui’. Socorro, tenho as lições dele na ponta da língua”, diz a artista.

Passava das oito da noite quando o ensaio terminou. Na estrutura intimista do Poeira, Andrea iniciou um debate sobre a peça. Era a tal criação de uma memória. Nenhum dos estudantes presentes viveu os anos de chumbo. Em seguida, todos eles caíram dentro da noite de Botafogo, não sem antes passarem pelo jardim, de onde pulula o nome “ADERBAL”, assim, em letras garrafais. As cinzas do diretor estão ali.

Somente Andrea e Yara ficaram na sala. Yara não vê incerteza no futuro do teatro brasileiro, com as mortes de Aderbal e Zé Celso, no ano passado, e de Antunes Filho, em 2019. “A premência hoje no teatro não é da linguagem, mas do poder de comunicação. E essa comunicação é feita por agentes que circulam por diversos meios”, afirma a diretora. A própria Andrea vai começar os estudos para voltar a uma novela das seis depois de 25 anos.

Escrita por Mário Teixeira, “No Rancho Fundo” estreia em abril como uma adaptação da peça “Capital Federal”, de Artur Azevedo. Na trama, Andrea interpreta o papel de uma roceira. Na Globo, a atriz esteve nas novelas “Rainha da Sucata”, “Pedra Sobre Pedra” e “Mulheres de Areia”. Atuou em “A Grande Família” e conquistou o país interpretando a Sueli, em “Tapas & Beijos”. Ela quer levar o seriado para as salas de cinema.

“Sei lá por que isso ainda não saiu do papel. Estou botando uma pilha em todo mundo, porque eu gostaria muito”, diz. Em quatro décadas, sua carreira conjugou a natureza comercial da TV à vida intelectual. A recém-publicação do texto de “Antígona: Ela Está Entre Nós”, resultado de seu monólogo inspirado na tragédia de Sófocles, simboliza o sucesso mesmo longe das câmeras. Ela afirma, no entanto, que sua ida para a televisão não foi uma concessão artística, com o objetivo de ter uma vida mais estável.

Tanto que, para fazer parte da “Armação Ilimitada”, em 1985, ela precisou “estar voando”. A atriz conta que aprendeu muito com as novelas e as minisséries, o que gera prazer até hoje. “A televisão me pagou as contas. Eu ajudei a fundar um teatro sem um centavo de lei de incentivo”, afirma. “Não há concessão. A televisão pagou a minha vida.”

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