Escalada da guerra na Ucrânia ameaça troca de prisioneiros e aumenta tensão entre Rússia e Ucrânia




Artigo de Jornal

Confiança destruída

O que torna a derrubada do Il-76 um caso particularmente mais intrincado em termos de consequências políticas no conflito é o fato de que o avião transportava prisioneiros de guerra ucranianos, que, segundo a versão russa, estavam sendo levados para a realização de uma troca de capturados.

As negociações para a troca de prisioneiros vinham sendo o único canal bem-sucedido de acerto entre as partes. Nos primeiros dias de janeiro, 248 soldados russos que estavam em cativeiro ucraniano retornaram à sua terra natal depois de complexas negociações mediadas pelos Emirados Árabes. Pelo outro lado, 230 pessoas regressaram à Ucrânia, segundo informações do presidente do país. Foi uma das maiores trocas de prisioneiros desde o início da guerra.

Em entrevista ao Brasil de Fato, Ruslan Bortnik, diretor do Instituto Ucraniano de Política, afirmou que o efeito político da crise em torno da queda do avião russo será a deterioração de um dos únicos pontos de negociação bem-sucedida entre Rússia e Ucrânia nos últimos tempos. De acordo com ele, essa situação pode levar a uma escalada ainda maior na relação entre as partes, e à perda de qualquer tipo de confiança entre Moscou e Kiev.

“Nos últimos dois meses foi estabelecida alguma base de confiança entre as partes que permitiu uma troca de prisioneiros de guerra, em um momento em que a Ucrânia até chegou a compensar a Rússia, entregando 75 pessoas adicionais pelo fato de que líderes do batalhão de Azov (da Ucrânia) foram enviados anteriormente para a Ucrânia através da Turquia”, explica.

De acordo com o analista, a crise em torno do avião militar pode ser instrumentalizada pelo Kremlin para recusar quaisquer conversações que poderiam ocorrer nos bastidores com a Ucrânia, considerando que Zelensky aprovou um decreto que proíbe negociações formais com a Rússia durante a guerra.

“Foi destruída uma certa base de confiança entre as partes, foi rompida a troca de prisioneiros de guerra, e essa situação pode potencialmente levar a uma escalada ainda maior da guerra daqui pra frente. E há uma suspensão da discussão da questão sobre uma possível trégua ou um congelamento da guerra”, afirma Bortnik.

A catástrofe aérea ocorre em um momento em que a Rússia assumiu a iniciativa na frente de batalha e vinha intensificando a ofensiva contra a Ucrânia. A estratégia russa atualmente está focada em assumir o pleno controle da região de Avdeevka e em torno de Kupiansk, territórios que a Ucrânia havia conseguido retomar durante a contraofensiva no ano passado.

No entanto, o cientista político argumenta que a Rússia tem certa motivação para assumir condições de congelamento da guerra, em particular, por conta da realização das eleições presidenciais em março deste ano. De acordo com Bortnik, “é do interesse da Rússia que as eleições ocorram em condição de segurança, para que haja um alto índice de legitimidade eleitoral nas urnas”, e as pessoas não tenham receio de sair de casa para votar.

Ao mesmo tempo, o analista aponta que são interesses temporários. Segundo o cientista político, após as eleições russas e antes das eleições dos EUA, a Rússia deve buscar maximizar a conquista de objetivos militares, em primeiro lugar, para influenciar nas eleições dos EUA.

“Quaisquer êxitos do exército russo vai afetar diretamente o índice de aprovação de Biden ou qualquer outro líder democrata nos EUA, porque isso faz parte de sua política externa, de sua responsabilidade”, completa o analista.


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