Exposição precoce à violência compromete aprendizagem e desenvolvimento de crianças na Maré, aponta estudo da Redes da Maré.

Um estudo realizado pela ONG Redes da Maré revelou que a exposição à violência desde a infância interfere de forma negativa no processo de aprendizagem e no desenvolvimento das crianças nas favelas do Rio de Janeiro, especialmente no maior conjunto de favelas da cidade.

O levantamento intitulado “Primeira Infância na Maré” constatou que a violência impacta diretamente no engajamento escolar e no acesso às atividades de lazer, cultura e esporte. Segundo a pesquisa, quase 60% dos moradores entrevistados afirmaram que as crianças de suas casas não têm oportunidade de participar dessas atividades.

O estudo também observou que algumas escolas da região não utilizam suas áreas externas por causa da proximidade com grupos armados.

No último domingo, o programa “Fantástico”, da TV Globo, divulgou imagens de criminosos realizando um treinamento de guerra em uma área da favela da Maré. As imagens foram captadas por drones da Polícia Civil do Rio de Janeiro como parte de uma investigação que durou dois anos. O espaço, que poderia ser destinado ao lazer, é ocupado por homens armados, enquanto ao lado estão uma creche e cinco escolas.

O estudo foi realizado entre julho de 2021 e junho de 2022 e buscou compreender as condições de vida das crianças de 0 a 6 anos nas 16 favelas da região, levando em consideração a divisão territorial controlada por diferentes grupos criminosos. A Redes da Maré identificou que a área é ocupada atualmente pelo Comando Vermelho, Terceiro Comando Puro e milicianos.

De acordo com Eliana Silva, diretora da ONG e coordenadora da pesquisa, a Maré não é uma comunidade homogênea, mas sim uma junção de favelas com características territoriais distintas, que influenciam a maneira como as privações de direitos e as múltiplas formas de violência são vivenciadas no cotidiano.

Os dados da pesquisa indicam que 39,6% das crianças de 0 a 6 anos já testemunharam algum tipo de violência. Isso acarreta atraso no desenvolvimento e na frequência escolar das crianças da região. Além disso, foram identificados prejuízos na saúde mental, como desestabilização emocional e sentimentos de medo, horror e aflição, além de mudanças comportamentais.

A região da Maré conta com seis creches e 15 Espaços de Desenvolvimento Infantil (EDIs). Segundo relatos de profissionais da educação presentes no estudo, as crianças brincam de forma tensa e reproduzem comportamentos associados à violência, como o uso simulado de armas. Alguns relatos mencionam crianças chorando e pedindo para ir para casa durante as brincadeiras.

Os depoimentos também afirmam que as crianças ficam mais agitadas e menos produtivas em situações de grande violência, como operações policiais ou confronto entre grupos criminosos.

Em 2022, 62% das ações policiais ocorreram nas proximidades de escolas e creches da região, de acordo com o estudo. O Boletim Direito à Segurança Pública na Maré, que monitora a violência armada na região, registrou 22 operações policiais em favelas da Maré, além de 8 confrontos entre grupos armados, resultando em 39 mortes por arma de fogo e 283 violações de direitos.

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