Gregório de Matos, poeta baiano do século XVII, tem seus textos inéditos lançados em livro, após 300 anos de espera.

Mais de 300 anos depois de terem sido compilados e copiados à mão, um conjunto de poemas atribuídos a Gregório de Matos (1636-1696) são publicados em forma de livro pela primeira vez. O chamado “Manuscrito Lamego”, por pertencer à coleção de Alberto Lamego, contém poesias de diferentes formas líricas escritas ainda no século 17. O volume original está no Instituto de Estudos Brasileiros, da Universidade de São Paulo, e permaneceu inédito. Agora, porém, a obra vem a público, integrando a Coleção Folha Clássicos da Literatura Luso-Brasileira, que chega às bancas no domingo, dia 27.

Conhecido como Boca do Inferno por sua verve satírica, Gregório de Matos foi tão influente que muitos poemas de outros autores são atribuídos a ele.

“Toda poesia gregoriana é atribuída ao poeta”, diz Marcello Moreira, do Departamento de Estudos Linguísticos e Literários da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. É dele a edição, estudo e revisão do Manuscrito Lamego da Coleção Folha.

“Do Gregório, não chegou aos dias de hoje nenhum manuscrito autógrafo, ou seja, redigido pelo próprio autor, como os que devem ter existido nos século 17 e desapareceram. Os que chegaram até nós são chamados apógrafos, manuscritos cuja origem não é certificada.”

Os poemas do soteropolitano eram escritos mais para serem escutados do que para serem lidos. Quando escritos, costumavam circular em folhas avulsas, chamadas volantes.

O códice é especial também porque guarda tanto poemas obrigatórios para qualquer boa antologia como versos menos conhecidos, que valem a pena serem publicados. “É um volume que reúne essas duas coisas”, diz Moreira.

Entre os populares, por exemplo, há o poema que fala de uma mulher de grandes nádegas e seios. Como explica Moreira, trata-se de uma sátira cômica de maledicência que fala de uma mulher, Laura, duplamente corcovada. “Com duas corcovas postas/ que amante não duvidara/ se tendes costas na cara/ se trazeis a cara às costas”, diz o poema.

Ou, ainda, aquele que trata de Luísa, que seria tanto uma bruxa como uma prostituta. Nele, o autor discute qual papel deveria ser desempenhado com prioridade: “Pois para bruxa sois moça,/ e sois velha para puta”.

Por sua vez, entre os poemas menos conhecidos, há um chamado “Verdades do autor”. Extenso, tem mais de 300 versos e, de acordo com Moreira, parece ser um exercício escolar “composto para que aquele que lesse pudesse internalizar princípios de retórica, gramática e poética em versos simples”.

Os versos seguem uma fórmula de redondilha simples, com sete sílabas e estrutura básica de sujeito mais predicado. Entretanto, o professor diz que o poema tem uma quantidade imensa de vocábulos do século 17, que não constam em dicionários, cujo sentido podem ser atribuídos pelo contexto e repetição. “A farinha do Brasil/ primeiro foi mandioca,/ milho estalado é pipoca”, dizem alguns dos versos.

O apelido de Boca do Inferno, contudo, não surgiu à toa. Ao mesmo tempo que podiam fazer rir, suas sátiras eram moralizantes. Logo, podiam ser interpretadas como reacionárias.

Matos atacava aquilo que era considerado vício ou pecado, exagerando “a parte com a qual se peca”. “Certas imagens ocorrem por causa da deformação do corpo humano no gênero satírico, produzindo uma hipérbole, uma majoração daquela parte para tornar mais evidente para o público o escândalo do pecado”, explica Moreira. Assim, o leitor encontrará em “Poemas do Manuscrito Lamego” versos como “os peidos fedem à merda” e “no cu o heis de beijar”.

Sobre Matos, nas palavras de Alcir Pécora, professor de teoria literária na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), no texto da contracapa do volume: “De tudo, nada lhe deu fama mais imperecível do que a qualidade de suas sátiras, nas quais feriu com o riso e mordeu como cão, não como ovelha. Quem o ler saberá por que fez jus ao apelido de Boca do Inferno”.

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