Luis Emilio Recabarren: A Contribuição Marxista na História Chile.



2 – Contribuições ao marxismo

A natureza da produção escrita de Luis Recabarren está intimamente ligada aos diversos momentos de sua vida e de sua militância, como as polêmicas com opositores e a intensa atividade nos jornais operários, ou de suas experiências de classe, sua formação cultural e suas próprias reflexões durante a vida. Ainda que ele não tenha elaborado uma sistematização teórica sobre os grandes temas do marxismo, levou a cabo um empreendimento reflexivo sobre a história chilena, a partir do contexto da luta do nascente movimento operário na indústria de mineração – em seus embates por melhores condições de vida e enfrentamento ao próprio Estado chileno (forjado aos moldes das elites de Santiago).

Sendo um intelectual orgânico – conforme a formulação gramsciana –, Recabarren, por um lado, não teve os vícios academicistas que acometem tantos marxistas; por outro, lhe faltava o apuro propiciado pela experiência acadêmica. Seu marxismo foi assim heterodoxo, prático – forjado por suas leituras e pelas questões do contexto histórico impostas aos rumos do movimento operário e do proletariado chileno.

Um exemplo das ideias de Recabarren está em uma de suas intervenções mais famosas, “Ricos y pobres a traves de un siglo de vida republicana” – texto apresentado como uma conferência, em Rengo, no ano de 1910, por ocasião do centenário da independência do Chile, mas escrito na prisão no ano anterior. Nele, faz uma avaliação crítica do processo de independência e da consolidação da burguesia como classe hegemônica no país e aponta as consequências disto para o conjunto da sociedade chilena. Sob a divisão fundamental “ricos” e “pobres”, Recabarren procurava estabelecer as origens da dominação de classe no Chile, que a seu juízo não era apenas “econômica”, mas também ‘moral”. Em relação às incipientes condições materiais de sobrevivência das classes trabalhadoras, refere-se diretamente ao elevado nível de analfabetismo, jornadas de trabalho intermitentes e à influência militar no povo – afirmando que “a pobreza, e a pobreza em grau excessivo sobretudo, impede todo progresso”. Sobre a pobreza material que submetia o povo, erguiam-se todos os aparatos institucionais destinados à conservação do poder burguês. Uma das mais duras críticas de Recabarren se destina ao sistema judicial e penitenciário, que ele, com a propriedade de ter sido preso várias vezes, identificava com os privilégios dos capitalistas: ambos se destinavam a impedir qualquer intento de transformação social, lançando a população pobre em sistema penal no qual ficava exposta a vícios e crimes.

Recabarren compreendia que tanto a pobreza quanto a decadência moral eram produtos da hegemonia burguesa iniciada com a independência. Segundo ele, as classes trabalhadoras chilenas não tinham motivos para comemorar a independência já que não tomaram parte neste processo, não foram chamadas a decidir sobre seus rumos e mantinham-se vítimas da opressão de classe constituída sob uma forma republicana e, só em teoria, “democrática”. Subjazia ainda uma crítica à ideia de nacionalidade, considerada a partir de uma ruptura historiográfica – com o imaginário dos heróis da pátria e a exaltação nacionalista dos personagens do processo de independência.


… (continuação do texto)


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