Pesquisa inédita revela que pessoas com Parkinson na rede pública gastam quase metade da renda mensal em custos extras relacionados à doença.

Pessoas com doença de Parkinson que são acompanhadas na rede pública de saúde gastam quase metade da renda mensal (49%) em custos extras relacionados à enfermidade —incluindo terapias e cuidadores—, mesmo com o tratamento medicamentoso sendo oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Essa conclusão é resultado de uma pesquisa inédita realizada pelo Programa de Pós-Graduação da Faculdade Israelita de Ciências da Saúde Albert Einstein.

Os autores analisaram dados de 1.055 brasileiros com Parkinson que recebem tratamento em dez hospitais terciários públicos em todo o Brasil, abrangendo todas as regiões. A doença de Parkinson é neurodegenerativa e progressiva, caracterizada pela degeneração dos neurônios produtores de dopamina, uma substância relacionada com o controle dos movimentos do nosso corpo. Esse processo resulta na destruição dessas células nervosas e manifesta-se por meio de vários sintomas, sendo os mais conhecidos a rigidez muscular e o tremor involuntário dos membros.

“A doença provoca sintomas motores, como lentidão, rigidez, tremor de repouso e desequilíbrio. Além de sintomas não motores, como diminuição do olfato, depressão, alterações de sono, de peso, no intestino. A base do tratamento é repor a dopamina no cérebro e usar medicações para melhorar os sintomas não motores, como antidepressivos, ansiolíticos, remédios para dormir”, explicou o neurologista André Carvalho Felício, do Hospital Israelita Albert Einstein, orientador da pesquisa.

Embora o Parkinson seja mais comumente associado aos idosos, estima-se que de 10% a 20% dos casos ocorram em adultos jovens, por volta dos 50 anos de idade. No caso da pesquisa, a idade média de início da doença dos participantes foi de 54 anos. “São pessoas que estão plenamente ativas na sociedade. No começo, a doença era mais relacionada aos idosos, mas a expectativa de vida aumentou nas últimas décadas e isso mudou”, disse a professora Tânia Bovolenta, biomédica e pesquisadora responsável pelo estudo.

Felício ressalta que apenas uma doença neurológica cresceu tanto em números de casos nas últimas décadas – é o Parkinson. “Isso aconteceu não somente porque a população mundial envelheceu, esse é um dos fatores. As pessoas mais velhas têm mais Parkinson, mais Alzheimer, mais demências. Mas a prevalência do Parkinson aumentou por causa das pessoas jovens com Parkinson, o que acaba tendo uma relevância mais significativa porque são pessoas ainda numa faixa produtiva. O nosso estudo demonstra isso e serve de alerta para lembrar que a doença pode sim ocorrer em pessoas mais jovens, incluindo pessoas com menos de 40 anos de idade”, disse.

Análise detalhada dos custos

Bovolenta explicou que a ideia surgiu devido à necessidade de estudar os custos da doença de Parkinson para os usuários do SUS, uma vez que não havia nenhuma base de dados brasileira disponível sobre o assunto. Na pesquisa, foram estabelecidos critérios de exclusão, como a presença de plano de saúde ou o uso de implante DBS (estimulação cerebral profunda).

De acordo com a pesquisa, devido ao envelhecimento da população, é estimado que até 2040 pelo menos 17 milhões de pessoas em todo o mundo terão Parkinson, tornando-a a segunda doença neurodegenerativa mais prevalente no planeta. Isso destaca a importância de uma análise aprofundada dos custos para a melhoria do sistema de saúde. No Brasil, estima-se que entre 1% e 3% da população seja portadora de Parkinson.

Para calcular os custos diretos e indiretos, os pesquisadores desenvolveram um questionário composto por 26 perguntas. Esse questionário abrangeu questões socioeconômicas e demográficas, bem como relacionadas à própria doença, como despesas com medicamentos, possíveis reformas e adaptações na casa, custos com cuidadores, aquisição de equipamentos de auxílio à mobilidade (como bengalas e cadeiras de rodas), gastos com terapias (incluindo fisioterapia, acompanhamento psicológico, terapia ocupacional, entre outros), despesas relacionadas a acessórios como sondas e fraldas, além dos custos de deslocamento e alimentação em dias de consultas médicas.

Os autores também levaram em consideração os custos indiretos associados à perda de produtividade dos cuidadores e a aposentadoria precoce. Os dados foram coletados no período entre 2019 e 2022.

De acordo com o estudo, o custo médio anual da pessoa com Parkinson no Brasil, incluindo o que é coberto pelo SUS, é de R$ 20.822,05, com 63,3% referentes a custos diretos e 36,9% a custos indiretos. Deste valor, em média, a pessoa paga R$ 10.237,32 por ano do próprio bolso, o que equivale a um gasto mensal de R$ 853,11. A renda média individual dos pacientes é de R$ 1.713 por mês (considerando o ano base de 2018). Isso significa que a pessoa compromete cerca de 49% de sua renda com esses custos extras relacionados à doença.

Ainda segundo a pesquisa, o principal custo adicional associado à doença de Parkinson foi relacionado aos medicamentos: 82% dos entrevistados tiveram que adquirir pelo menos um medicamento para o controle da doença ao longo de 12 meses, e 13,2% precisaram comprar todos os medicamentos necessários para manter sua condição sob controle. Esses medicamentos incluem antiparkinsonianos, ansiolíticos, antipsicóticos e remédios para demência.

“Teoricamente, todos os medicamentos necessários para controle do Parkinson são oferecidos na rede pública. Mas ainda existem muitas falhas no sistema e nem sempre as pessoas com Parkinson conseguem ter acesso às medicações. Ou porque a medicação está em falta, porque moram longe, ou na sua cidade não há a dispensação dos medicamentos. Também há casos em que não existe alguém que possa ir buscar essa medicação e a pessoa acaba comprando para manter sua doença controlada. São vários fatores que influenciam o acesso”, explicou a pesquisadora.

Bovolenta destacou ainda que, embora existam algumas pessoas que usam somente uma medicação, há outras que chegam a tomar 20 comprimidos por dia – incluindo medicamentos ansiolíticos, para dormir, para demência. “Nem todos esses remédios são dispensados na rede pública. Alguns chegam a custar R$ 200 a caixa”, disse.

Cuidadores

Os resultados do estudo indicam que 78% dos pacientes entrevistados tinham cuidadores, sendo este o segundo principal gasto apontado pela pesquisa. Dentre esses, 73% informaram que o cuidador era um membro da família, enquanto 13% relataram que pagavam pelo serviço. Em geral, como explicou Bovolenta, esses cuidadores são familiares que deixam de trabalhar, o que também causa um impacto significativo na renda mensal familiar e nos custos associados à doença.

“É um fardo ser o cuidador de uma pessoa com uma

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