Brasília, novembro de 1989. Enquanto 82 milhões de eleitores brasileiros voltavam às urnas para a primeira eleição presidencial direta desde o golpe militar de 1964, xxxx jornalistas e veículos que cobriam as atividades da Câmara, do Senado e do Palácio do Planalto estavam sujeitos à mira do Serviço Nacional de Informações (SNI), principal braço de espionagem da ditadura.
Quatro anos após a redemocratização, os relatórios produzidos pelo SNI em relação aos jornalistas credenciados nas três casas mantinham o alvo preferencial dos militares: a esquerda. Documento do SNI guardado no Arquivo Nacional listava o nome de todos os jornalistas e veículos de comunicação devidamente registrados nos comitês de imprensa do Planalto e do Congresso. Não há registro do que foi feito, na prática, com esse material.
Controle das comunicações
Embora a relação reunisse profissionais dos mais variados espectros ideológicos, a preocupação do serviço de espionagem recaía sobre o “controle das comunicações” pela esquerda. É o que atesta o relatório de 10 de novembro de 1989 intitulado “Esquerdas controlam matéria jornalística no Congresso Nacional”.
“Ou seja, toda a notícia que é veiculada através da imprensa escrita e televisada tem a interferência do grupo. Tais profissionais de imprensa citam como exemplo um jornal (não foi dito o nome) dirigido pelo jornalista José Tarcisio Saboia Holanda (Correio Braziliense) – considerado entre seus pares como conservador – que está publicando matéria de facções esquerdistas”, diz o texto de abertura do relatório.
“Infiltração esquerdista”
No trecho seguinte, chamado de “Infiltração na área jornalística dentro do Congresso Nacional e Palácio do Planalto”, o relatório destaca que “um grupo de jornalistas credenciados, tidos como esquerdistas, estariam filtrando, de acordo com suas conveniências político-ideológicas, todas as notícias que são veiculadas pela imprensa escrita e televisada naquela Casa”.
Do SNI à Abin
O SNI foi sucedido pelo Departamento de Inteligência da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República. O departamento foi elevado à condição de Subsecretaria de Inteligência pelo presidente Itamar Franco. Em 1999, no governo Fernando Henrique Cardoso, a SAE virou a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), que ainda hoje existe. O órgão foi envolvido em um escândalo de espionagem no governo Jair Bolsonaro. Segundo a Polícia Federal, a Abin foi usada por sua antiga cúpula para espionar jornalistas, adversários e até aliados do ex-presidente.