Disputa presidencial na Argentina: uma análise complexa que vai além das categorias políticas tradicionais

Na disputa presidencial argentina, os rótulos ideológicos tradicionais não são suficientes para compreender a complexidade envolvida. No primeiro turno, tivemos três candidatos competitivos que representam diferentes espectros políticos. Patricia Bullrich, que ficou em terceiro lugar, é identificada com a centro-direita conservadora. Javier Milei, que terminou em segundo lugar e agora disputa o segundo turno, é um ultraliberal rotulado como extrema direita. Seu adversário é Sergio Massa, um peronista que venceu com folga o primeiro turno prometendo defender os trabalhadores e os direitos sociais em meio à grave crise enfrentada pelo país.

Nesse cenário, é natural enxergar Massa como o candidato mais progressista e de esquerda. No entanto, é importante destacar que no primeiro turno havia uma candidata de esquerda, Myriam Bregman, que obteve a última colocação. Para compreender melhor o peronismo e sua representatividade na Argentina atual, é necessário ir além dessas categorias simples.

O peronismo surgiu durante a década de 1940, quando um golpe militar levou ao poder um grupo formado por militares que perseguia movimentos populares. No entanto, Juan Domingo Perón, ministro do Trabalho na época, preferia se aproximar dos trabalhadores e movimentos sindicais, promovendo a justiça social. Ele criou benefícios como salário mínimo e 13º, o que desagradou as elites e levou-o à prisão.

A detenção de Perón desencadeou uma série de manifestações populares, sendo a mais notória nove dias depois, em 17 de outubro, conhecida como “patas en la fuente”. Uma mobilização liderada pela classe trabalhadora invadiu Buenos Aires e ocupou a Praça de Maio para exigir a liberdade de Perón. Nesse contexto, surge o peronismo, representando uma corrente política com peso de massas que dialogava tanto com a esquerda como com a direita.

Durante o primeiro governo de Perón, houve uma mudança no modelo econômico argentino, com a passagem do primário-exportador para a industrialização e a inclusão dos trabalhadores na política. No entanto, também houve um aumento no controle sobre os sindicatos e uma relação mediada por Eva Perón, que ajudou a popularizar a imagem de um Estado benfeitor.

No período seguinte, quando Perón sofreu um golpe militar e se exilou na Espanha, ocorreu uma proibição do peronismo. No entanto, surgiram movimentos de resistência, como o Cordobazo e a organização político-militar chamada “montoneros”, que se reivindicavam peronistas. Esses eventos pavimentaram o caminho para uma terceira fase do peronismo, que durou até a morte de Perón.

O peronismo é considerado um caso clássico de populismo histórico latino-americano, assim como o varguismo no Brasil e o cardenismo no México. O peronismo promoveu a inclusão dos trabalhadores na política e a redistribuição de renda, estimulando o consumo da população e enfrentando desafios como a inflação.

Portanto, é importante compreender que o peronismo vai além das categorias simples de esquerda e direita. Representa um movimento político que dialoga com diferentes espectros, buscando promover justiça social e melhorias na qualidade de vida dos argentinos. O próximo presidente enfrentará grandes desafios, como a crise econômica e a inflação, mas certamente o peronismo será um fator importante na configuração política do país.

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