História e legado de Beatriz Nascimento: o movimento negro no Brasil e o feminicídio que encerrou sua trajetória




Beatriz Nascimento: uma história de resistência e luta

Em 1989, o resultado dessa trajetória foi transformado no documentário Ôrí, filmado e dirigido pela cineasta Raquel Gerber, com textos e narração da própria historiadora. O filme conta a história dos grupos que fizeram o movimento negro do Brasil nos anos 1970 e 1980. Nascimento disse que o processo de Ôrí era “uma recriação de identidade nacional através do movimento negro”.

“Nós, na Década de 70, éramos mudos. E os outros eram surdos. A partir de então, começa a falar sociologicamente. E esta lógica estava embutida no processo da própria história do Brasil”, afirmou ela.

Nascimento deslocou o eixo dos estudos da negritude brasileira ao propor a necessidade de uma história do povo afro-brasileiro, e não a história da escravidão – que era o que se fazia. “Essa pesquisa militante foi o seu grande legado”, pontua o geógrafo e antropólogo Alex Ratts, professor na Universidade Federal de Goiás (UFG) e autor de, entre outros, Eu sou Atlântica: Sobre a Trajetória de Vida de Beatriz Nascimento.

“Ela encontrou barreiras em sua época dentro do mundo acadêmico, mas felizmente hoje sua obra tem sido resgatada por uma nova geração de pesquisadores”, comenta o historiador e arqueólogo Luis Felipe Santos, presidente do Instituto AfrOrigens. “O mundo acadêmico foi e continua sendo um mundo extremamente branco”. A historiadora Abreu concorda que “Nascimento não tinha espaço na academia branca”.

Ratts acrescenta que era uma época em que “não existiam mulheres negras com tanta projeção” e Nascimento propunha uma discussão muito rica dos papéis de gênero dentro da história da população negra no Brasil – à época, não se usava o termo gênero, “falava-se de relações de raça e sexo”.

“Mas sempre houve uma discussão madura, entre as mulheres negras, sobre essas relações, a situação da mulher negra na escravidão, e também do homem negro. É um tipo de pensamento que não cabia e nem cabe no feminismo de maioria branca que se consolida desde os anos 1970. As feministas negras têm de falar o que foi a escravidão, o que ocorreu com o corpo negro no período escravista”, pontua o antropólogo.

Feminicídio

Nascimento desenvolvia seu mestrado na UFRJ quando passou a aconselhar uma amiga, vítima constante de violência doméstica, a abandonar o companheiro, um homem com passagens policiais por acusações de homicídio, tentativa de estupro e envolvimento com drogas.

Incomodado e alegando que a historiadora estava interferindo em sua vida pessoal, esse homem deu cinco tiros e a matou em 28 de janeiro de 1995. Ela tinha 52 anos.


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