Posicionamento ideológico e divisões sobre pautas de costumes em partidos políticos ao redor do mundo

A pauta de costumes que tem ganhado destaque na reta final da campanha eleitoral de 2022 no Brasil também se manifesta em outros países ao redor do mundo, não se limitando apenas à esquerda política. De acordo com levantamentos internacionais, partidos com visão mais esquerdista na economia se dividem quando se trata de temas como aborto, banheiros unissex e interferência do Estado na educação das famílias. Por outro lado, a direita política apresenta uma concentração maior de siglas tradicionalistas.

Para compreender a relação entre o pensamento econômico e a visão sociocultural dos líderes mundiais, a Folha recorreu a dois índices de posicionamento ideológico. O primeiro índice utilizado é o Ches (Chapel Hill Expert Survey), uma pesquisa financiada pela Universidade da Carolina do Norte – Chapel Hill que conta com a contribuição de acadêmicos de todo o mundo. Já o segundo índice é o V-Party, criado pelo Instituto V-Dem, da Universidade de Gothenburg, na Suécia.

O Ches avaliou a posição das legendas em relação a valores sociais e culturais, como aborto, divórcio e casamento entre pessoas do mesmo sexo. Já o V-Party mediu o respeito aos direitos das minorias, sem qualquer distinção de raça, cor, sexo ou religião. Com base nesses dois índices, foram levantados dados da ideologia dos partidos no poder em 99 países que detêm 80% da população mundial.

Os resultados mostram que 43% dos partidos no poder foram considerados de esquerda na economia, enquanto 23% foram classificados como de centro e 33% como de direita. Em relação aos costumes, 31% dos partidos foram considerados libertários, 28% moderados e 40% tradicionalistas.

Entre os partidos de esquerda na economia, 42% foram considerados libertários em questões de costumes, enquanto 23% foram classificados como moderados e 35% como tradicionalistas. Já entre as legendas de direita, 48% foram consideradas tradicionalistas, 21% libertárias e 30% situaram-se no espectro intermediário.

Alguns governos de esquerda na economia, mas conservadores nos costumes, são os do Peru, Venezuela e México. Na Venezuela, o ditador Nicolás Maduro tem histórico de declarações homofóbicas. No México, o presidente Andrés Manuel López Obrador também foi posicionado no índice Ches como mais tradicionalista, tendo enfrentado críticas de movimentos feministas.

Já governos de esquerda classificados como tradicionalistas nos costumes são os de Chade, Coreia do Norte, Cuba, Eritreia, Hungria, Laos, Nigéria, Turcomenistão e Zimbábue. O caso da Hungria e da Polônia também é interessante, pois esses governos foram considerados de esquerda na economia, mas de direita no geral.

De acordo com especialistas, a sobreposição de ideologia em relação a economia e questões socioculturais não acontece em todos os países. Na Europa, por exemplo, há uma separação entre os posicionamentos dos partidos nessas áreas. Fatores como migração e questão ambiental ajudam a explicar essa diferença.

No Brasil e nos Estados Unidos, por sua vez, há uma tendência de a política ser unidimensional, ou seja, a posição sobre uma questão comportamental permite mapear valores sobre outras áreas. Para a direita política, por exemplo, defender menos Estado na economia e mais intervenção nas escolhas individuais pode fazer sentido. Já para a esquerda, há uma convicção pessoal dos governantes aliada a estratégias de sobrevivência eleitoral.

Apesar das diferentes posições dos partidos no poder, a maioria dos governos esquerdistas do período de 2000 a 2015 investiu na melhoria das condições de vida de mulheres pobres e promoveu a representatividade feminina. No entanto, ainda há contradições, já que esses governos não adotaram medidas que mudassem estruturalmente a desigualdade de gênero e renda.

Em resumo, a análise dos índices de posicionamento ideológico mostra que tanto a esquerda como a direita política apresentam diversidade de opiniões em relação aos costumes. Enquanto a esquerda tende a ser mais libertária em alguns aspectos, a direita se concentra em posições tradicionalistas. Essas divergências refletem as diferentes realidades e contextos políticos de cada país.

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