Tortura, superpopulação e escassez de recursos: especialistas destacam desafios do sistema carcerário em debate intenso.

Representantes do governo federal, do Ministério Público, da Defensoria Pública, das assembleias legislativas e da sociedade civil se reuniram nesta quarta-feira (30) em uma audiência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados para discutir o quadro crítico do sistema prisional do Brasil. Durante o encontro, foram apontados problemas como superlotação, tortura, ressocialização ineficiente e baixo orçamento.

De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o Brasil possui atualmente 832.295 presos, o que representa um excedente de 230 mil prisioneiros em relação à capacidade do sistema penitenciário. Dentre os presos, a maioria é composta por homens (95%), negros (68%) e jovens com até 29 anos de idade (43%). A situação é ainda mais preocupante quando se considera as condições insalubres, o jejum compulsório e a extrema calamidade relatada pela Pastoral Carcerária Nacional e pela Defensoria Pública Federal.

Durante a audiência, Carolina Lemos, coordenadora-adjunta do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura do Ministério dos Direitos Humanos, destacou a frequência das práticas de tortura no sistema prisional. Segundo ela, a tortura não ocorre por acidente ou exceção, mas é estrutural nesse ambiente. Carolina ressaltou a importância de não aceitar a desumanização e a morte dos detentos nessa máquina de moer gente.

As entidades da sociedade civil presentes na audiência também levantaram a falta de dados sobre a assistência do Estado na ressocialização dos presos e na reintegração social daqueles que são libertados. Em uma carta lida pelo deputado Defensor Stélio Dener (Republicanos-RR), a Articulação Nacional dos Familiares de Presos expressou o desejo de que seus parentes tenham a oportunidade de se ressocializar e se tornarem membros produtivos da sociedade novamente.

Diante das limitações de orçamento herdadas do governo anterior, o secretário nacional de Políticas Penais do Ministério da Justiça, Rafael Brandani, admitiu a complexidade do tema. Ele ressaltou que o Fundo Penitenciário Nacional precisa ser recapitalizado, já que sua capacidade de investimento é agora de menos de 30% do que era antes. Brandani também informou sobre a busca de normatização do uso de câmeras corporais nos agentes penitenciários como forma de coibir a violência carcerária.

Uma das estratégias do governo para combater a superlotação é a implementação de políticas de alternativas penais. Rafael Brandani citou o exemplo dos 33 mil presos por furto simples ou qualificado sem grave ameaça, que custam cerca de R$ 800 milhões por ano ao Estado. Esses presos poderiam estar cumprindo penas alternativas ou usando monitoramento eletrônico.

Fernanda de Oliveira, coordenadora de Combate à Tortura e Graves Violações do Ministério dos Direitos Humanos, sugeriu mudanças no Código de Processo Penal para limitar as situações de prisão provisória aos casos de risco à instrução criminal ou de risco de não cumprimento da pena em caso de condenação. Segundo ela, não é necessário construir mais nenhuma unidade prisional no Brasil, considerando que existem 180 mil presos provisórios e um déficit de 162 mil vagas.

Os parlamentares presentes na audiência destacaram a importância de buscar soluções consensuais para o problema do sistema prisional. Luiz Couto (PT-PB), um dos autores dos requerimentos para a realização da audiência, ressaltou que o caminho para encontrar essas soluções passa pelo resguardo da coletividade e pela responsabilidade humana das pessoas submetidas ao sistema prisional.

A deputada Erika Hilton (Psol-SP) propôs que a Comissão de Direitos Humanos realize diligências em presídios de diversos estados do país. Durante o debate, promotores, advogados e parlamentares de Ceará, Goiás, Pará e Paraíba relataram situações específicas de seus respectivos estados.

Diante desse quadro crítico do sistema prisional brasileiro, é fundamental que medidas efetivas sejam adotadas para garantir os direitos humanos dos detentos, garantindo sua integridade física e psicológica. Somente com ações concretas será possível alcançar a ressocialização dos presos e a construção de um sistema penitenciário mais justo e humano.

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